Respiração e Movimento – O Prazer de estar cheio de vida - Alexander Lowen
26 de Outubro de 2005
Você já observou como está a sua respiração hoje?
Muitas vezes a nossa condição emocional interfere em nossa respiração. Se estamos mais ansiosos, mais tensos, agitados, na expectativa por algo a respiração tende a ser mais acelerada. Quando as pessoas estão mais tristes, deprimidas a respiração tende a ser mais lenta.
Isto quer dizer que podemos fazer o caminho inverso, melhorando e muito a nossa qualidade de vida. Se lembrarmos algumas vezes durante o dia de observarmos a nossa respiração, seja no trabalho, em casa, no trânsito, caminhando, ao dar uma palestra, ao ter que tomar uma decisão perceberemos que muitas vezes ela estará alterada. Podemos nos propôr a fazer uma respiração lenta e profunda por alguns minutos. Isto nos trará um equilíbrio maior, uma integração do nosso corpo com a emoção e aumentará a capacidade de auto-percepção.
Experimente e perceba a diferença. Sobre este tema escolho um trecho do livro Prazer de Alexander Lowen.
Todos já sentiram alguma vez na vida o simples prazer que acompanha a recuperação após uma doença ou um acidente. No primeiro dia de saúde normal, sente-se com intensa satisfação a alegria de estar vivo. Como é agradável respirar bem fundo. Que emoção é mover-se fácil e livremente. A perda da saúde faz a pessoa perceber seu corpo e tornar-se consciente da boa saúde. Infelizmente essa percepção logo desaparece e a sensação maravilhosa que a acompanha se esvai. Assim que o indivíduo retoma suas atividades habituais, é envolvido por motivações que o dissociam de seu corpo. Preocupa-se com acontecimentos e assuntos do mundo externo e rapidamente esquece a revelação de que o prazer é a percepção de estar cheio de vida aqui e agora - o que significa estar plenamente vivo num sentido corporal.
Tendo se dissociado de seu corpo, não pensa mais em termos corporais. Ignora a simples verdade de que para se viver é preciso respirar, e quanto melhor for a respiração, mais vivo se estará. Sentirá que de vez em quando sua respiração é limitada, e em determinadas ocasiões, especialmente sob estresse, poderá perceber que está segurando a respiração, mas não leva a sério.
Quando a respiração se torna difícil, deveríamos abandonar tudo para voltarmos a respirar com facilidade. Já sabemos que respirar é um caso de vida ou morte ou, para colocar de uma maneira positiva, que a vida depende da respiração.
Outra verdade simples e que deveria ser evidente é que nossa personalidade se expressa através do corpo tanto quanto através da mente. Não se pode dividir alguém em mente e corpo. O corpo de uma pessoa nos conta muito sobre sua personalidade. Dependendo da postura, brilho dos olhos, tom da voz, posição do maxilar e dos ombros, facilidade em se movimentar e espontaneidade dos gestos ficamos sabendo não só quem a pessoa é, como também se está aproveitando a vida ou está triste e constrangida. A verdade do corpo de uma pessoa pode ser dolorosa, mas bloquear essa dor irá fechar a porta para a possibilidade de prazer.
As pessoas podem se queixar de depressão, ansiedade mas estes são sintomas de um distúrbio mais profundo, isto é, incapacidade de aproveitar melhor a vida. A pessoa não está totalmente cheia de vida, nem seu corpo, nem sua mente. Deve ser atacado simultaneamente no nível físico e no psicológico. Só quando uma pessoa se torna totalmente viva, sua capacidade para sentir prazer poderá ser restaurada totalmente.
Qualquer mudança na maneira de pensar de uma pessoa está condicionada a uma mudança no funcionamento de seu corpo. As duas funções mais importantes a esse respeito são a respiração e os movimentos. Essas duas funções encontram-se perturbadas, em toda pessoa que tem conflitos emocionais, por tensões musculares, que são o lado físico dos conflitos psicológicos.
Através dessas tensões musculares os conflitos se estruturam no corpo. Quando isto acontece, eles não podem ser resolvidos até que as tensões sejam aliviadas. Para afrouxar essas tensões devemos vê-las como limitações da auto-expressão. Não é suficiente estarmos atentos à dor. E algumas pessoas não estão conscientes nem disso. Quando uma tensão muscular torna-se crônica, ela é eliminada da consciência, e perdemos a percepção dessa tensão.
As sensações são determinadas pela respiração e pelos movimentos. quando o braço fica imobilizado durante um certo tempo, torna-se dormente e insensível. Para que as sensações voltem é preciso que sua mobilidade seja restaurada. É por isso que prender a respiração é o método mais eficiente de eliminar sensações. Este princípio também funciona ao contrário. Assim como as emoções fortes estimulam a respiração e a fazem tornar-se mais profunda, a estimulação da respiração e as inspirações profundas podem trazer à superfície emoções fortes.
A morte é uma interrupção da respiração, uma imobilização dos movimentos e uma perda das sensações. Estar cheio de vida é respirar profundamente, mover-se livremente e sentir com intensidade. Essas verdades não podem ser ignoradas se valorizamos a vida e o prazer.
Sabemos que a respiração é imprescindível à vida, que o oxigênio fornece a energia que move o organismo, mas parece que não compreendemos que uma respiração inadequada reduz a vitalidade do organismo. A queixa comum de cansaço e exaustão geralmente não é atribuída à má respiração. No entanto, a depressão e a fadiga são resultados diretos da má respiração. Não há uma boa combustão metabólica na ausência de oxigênio suficiente, assim como uma lareira com uma chaminé ruim. Em vez de vibrar com a vida, a pessoa com má respiração é fria, inerte e sem vida. Não tem calor nem energia. Sua circulação é afetada diretamente pela falta de oxigênio.
A maioria das pessoas respira mal. sua respiração é superficial e há uma forte tendência a prendê-la em qualqur situação de estresse. Mesmo em situações simples como dirigir um carro, datilografar uma carta, uma entrevista para emprego. em uma visita ao dentista as pessoas costumam sentar-se na cadeira tenso, cruzando os braços com força. Isto além de aumentar o medo aumenta também a dor. Limitando a respiração resultará em aumento de tensão. Quando as pessoas tomam consciência de sua respiração geralmente comentam como respiram pouco.
A incapacidade de respirar plena e profundamente é também responsável pelo fracasso em se conseguir uma satisfação sexual plena. Prendendo a respiração ao se aproximar o clímax, eliminam-se as fortes sensações sexuais. qualquer limitação da respiração durante o ato sexual elimina o prazer sexual.
E por que as pessoas sentem dificuldades em respirar profundamente e com facilidade? A respiração cria sensações, e essas pessoas tem medo de sentir. Tem medo de sentir sua tristeza, sua raiva e sua apreensões. Quando eram crianças seguravam a respiração para não chorar, puxavam o ombro para trás, tensionando o peito para conter a raiva, e apertavam a garganta para conter um grito. O efeito de cada manobra é a limitação e a redução da respiração. Da mesma maneira, a contenção de qualquer sentimento resulta numa inibição da respiração. Já adultas as pessoas continuam a inibir a respiração para manter esses sentimentos reprimidos. A incapacidade para respirar torna-se o principal obstáculo para se recuperar a saúde emocional.
A respiração normal reveste-se de uma qualidade plena e única.
A inspiração começa com um movimento do abdômem para fora, quando o diafragma se contrai e os músculos abdominais se relaxam. Essa onda de expansão, em seguida sobe para atingir o tórax. não é interrompida no meio, como acontece com pessoas perturbadas. A expiração por sua vez começa com o peito cedendo e segue como uma onda de contração até a pélvis. Na respiração saudável a frente do corpo se move com um todo num movimento ondulante. A imobilidade pélvica causa um distúrbio, porque normalmente há um movimento leve para trás da pélvis na inspiração e um movimento leve para a frente na expiração. Se a pélvis estiver imobilizada em qualquer uma dessas posições, a movimentação não se verifica.
A cabeça também é envolvida pelo processo respiratório. Junto com a garganta, forma um grande órgão aspirador que leva o ar aos pulmões. Se a garganta estiver contraída, essa ação aspirante é reduzida. Quando o ar não é aspirado, a respiração torna-se superficial. Já se observou que os bebês submetidos a alguma perturbação no seu impulso de mamar ficaram com a respiração afetada. Nota-se que logo que um paciente aspira o ar como se mamasse, sua respiração torna-se mais profunda.
A relação entre sucção e respiração pode ser percebida claramente no ato de fumar. A primeira tragada num cigarro é uma forte aspiração que faz com que sorva a fumaça como se deveria sorver o ar. Há uma sensação temporária de satisfação quando a fumaça enche a garganta e os pulmões, e a pessoa sente seus pulmões tornarem-se vivos em resposta à ação irritante do fumo. Quanto mais a pessoa fuma, menos respira. Entretanto por causa de sua primeira experiência, a pessoa não consegue abandonar a sensação de que o cigarro é essencial para ajudá-la a respirar.
A respiração também se encontra diretamente relacionada com a emissão da voz, que é uma outra atividade vibratória do corpo. Inibições de choros, gritos são estruturadas como tensões que limitam a respiração. Quem na infância aprendeu que "crianças foram feitas para serem vistas e não ouvidas" não respira à vontade.
A tendência natural para se falar o que se pensa, chorar ou gritar quando se sente vontade é abafada por espasmos na musculatura do pescoço. Estas tensões afetam a qualidade da voz criando uma fala delicada demais ou muito grave, sem inflexão ou sibilante. A voz deve ser restabelecida para que volte a utilizar seu registro completo, e as tensões específicas no pescoço devem ser liberadas se quisermos que a respiração volte a ser profunda.
Qualquer emoção que não possa ser liberada representa um estresse para os músculos. O que é verdade, porque a emoção é uma carga que faz pressão para fora, tentando se liberar. Sentimentos de tristeza ou dor são liberados através do choro. Se esse choro for reprimido por causa da proibição dos pais ou por qualquer razão, os músculos que se tornam tensos são os músculos da boca, garganta, peito e abdômem. Se o sentimento que não pode ser liberado é o de raiva, os músculos das costas e dos ombros tornam-se tensos. Impulsos de morder trazem tensões nas mandíbulas, assim como chutes reprimidos trazem tensões nas pernas. A relação entre tensão muscular e inibição é tão exata que se pode dizer quais os impulsos ou sentimentos que estão sendo inibidos numa pessoa, estudando suas tensões musculares.
Podemos recuperar a mobilidade natural do corpo. A mobilidade se refere aos movimentos espontâneos do corpo sobre os quais são sobrepostos os movimentos conscientes maiores. A mobilidade de uma pessoa se reflete na vitalidade de sua de sua expressão facial, na qualidade dos seus gestos e na extensão de suas reações emocionais. A mobilidade corporal é a base de toda a espontaneidade, que por sua vez é o ingrediente essencial tanto do prazer como da criatividade. A espontaneidade é uma expressão da criança que existe dentro de nós, e sua perda indica que a pessoa está sem contato com essa criança e afastada de sua infância.